Espaço de atividade literária pública e memória cronista

sexta-feira, 20 de setembro de 2013

Lugares de Felgueiras, em Conferência na Longra...


No âmbito das apelidadas Jornadas Europeias do Património 2013, tem lugar esta sexta-feira, dia 20 de Setembro, na Casa do Povo da Longra, uma conferência sob título “Lugares de Felgueiras”, subordinada ao caso do local arqueológico apelidado de Cimalha.  Sessão essa que, com efeito (e segundo informa o cartaz, do qual tivemos conhecimento através de informação por pessoa amiga, na Internet), é dedicada ao conhecimento do chamado povoado da Cimalha, que em tempos foi descoberto e depois continuou soterrado no alto de Cimalhas, na fronteira de Rande com Sernande, uma das áreas da nova divisão administrativa que vai englobar Pedreira, Rande e Sernande, conforme o que foi decidido ainda há pouco tempo pelos poderes reinantes.

A propósito desta realização, atente-se na curiosidade duma atual nota divulgativa a nível nacional, publicada na imprensa desta sexta-feira, expressar assim tal curiosidade:

«Património é avó que tem de ser conservada», diz Souto de Moura

Na abertura das Jornadas Europeias do Património, o Prémio Pritzker equiparou o património a uma avó, uma que este «convive conosco, tem de ser bem conservado e não tem preço». O arquiteto Eduardo Souto de Moura entende que o «património é uma avó», que devemos estimar sem deitar contas aos custos.
Na abertura das Jornadas Europeias do Património, o Prémio Pritzker explicou que, tal como uma avó, o património «convive conosco, tem de ser bem conservado e não tem preço». Para o arquiteto, não se pode olhar a gastos para conservar o património como se faria com uma avó, pois «faz parte da cultura das pessoas conservar a afetividade». «É uma coisa do dia a dia. Não é uma coisa de que vamos falar de vez em quando», concluiu o arquiteto.


Na pertinência do tema, aproveitamos para recordar algo relacionado, que toca em afinidade no assunto. Através de um artigo já publicado parcialmente na imprensa felgueirense e destinado a integrar um trabalho literário a editar quando for possível.

Arqueologia histórica Felgueirense

            Quanto a notícias do passado, patentes em arqueologia pé-histórica local, sendo a região felgueirense como um refúgio algo ignoto em certas circunstâncias, detém o concelho de Felgueiras alguns presumíveis tesouros guardados no solo, sobretudo com relação a tempos remotos. Aliás lendas há relativas, com alusão sobre transmissões orais, referindo alguns objectos que teriam sido enterrados aquando da fuga dos mouros. Mas especialmente existem restos arqueológicos, desde a Idade do Bronze, pelo menos, bem como houve continuidade de formas de povoamento depois na Idade do Ferro, como há informações da área ter sido densamente povoada ainda antes da colonização romana, como ponto de passagem de Suevos, Celtas e Visigodos, assim como conheceu sensível desenvolvimento humano, económico e social desde a alta Idade Média e nomeadamente depois da Reconquista Cristã.
Do pecúlio longínquo e de toda a sucessão cultural derivada da estada de diversos povos, a região do actual território de Felgueiras é terra rica de tradições e com uma história velha em séculos que enriqueceu o seu património diverso, com realce ao arqueológico. Apesar de, na matéria em apreço, se poder só incidir atenção pelas antigas informações que ficaram transmitidas e pelas escassas recolhas, por ora elaboradas, de testemunho detentor de antigos povoamentos. O romano Plínio deixou expresso que na segunda metade do séc. I d. C. ainda existiam na região variadas cividades, englobando castros, referindo os antigos Calaicos. Dados mais tarde alastrados por pesquisadores antigos, inicialmente por estudos divulgados, em 1734, de ruínas e vestígios de antiguidades do conhecimento do historiador D. Jerónimo Contador de Argote (oriundo do sul, mas residente no Minho algum tempo), depois através de iniciativa do vimaranense Dr. Francisco Martins Sarmento, a partir de 1876. O qual descobriu e estudou diversos sítios arqueológicos, como em Lagares, onde havia característica de cavidades em forma de túmulos, que fariam parte de um grande povoado pré-histórico, posteriormente romanizado, conforme alguns dos achados indicaram, como o labor do mesmo indagador teve incidência igualmente em Regilde, no castro das Lazarinhas (lugar também conhecido por Coutada), detentor de uma série de plataformas sobranceiras ao rio Vizela, bem como havia vestígios de muralhas, fossos defensivos e estruturas de habitações da época que remontou até ao período romano, onde inclusive surgiu uma moeda imperial, além de fragmentos de cerâmica e alguns exemplares de mós manuais no cristelo de Santa Comba. Estendendo-se esses achados por outras freguesias, com destaque para o aparecimento de uma estátua de guerreiro galaico-lusitano em S. Jorge de Vizela e uma estatueta feminina sem cabeça encontrada no alto castrejo de Sendim, de cujo labor os respectivos achados ficaram na sua Sociedade Martins Sarmento. Depois, por acção pessoal, o felgueirense Dr. Eduardo Freitas descobriu alguns testemunhos funerários, sobretudo um dólmen, da Refontoura, mais alguns vasos, moedas e mesmo uns ex-votos lusitanos, dos quais se conhecem divulgações por terem ficado em sua posse os objectos descobertos (posteriormente passados à sua família, segundo A. Fernandes). Trabalhos que se alongaram desde as alturas dos montes de Pinheiro até ao de Santa Quitéria e no outro extremo pela Eira dos Mouros, que se estendia da Lixa até aos contornos do monte de Santa Marinha, na área de Airães e Pedreira. Mais tarde, por meio de trabalhos públicos de pesquisas, houve novidades de povoamentos antigos da bacia inicial do rio Sousa, nas veredas de Sousa e necrópole do Senhor dos Perdidos, da proto-história à romanização, incluindo mesmo informações de um povoado da Idade do Bronze, como o chamado Povoado da Cimalha (cujos vestígios não devem ter sido muito valorizados, oficialmente, atendendo a que foram soterrados pouco depois de seu estudo e seguinte construção dos acessos à auto-estrada A11), mais algo de arqueologia romana, com respeito às descobertas da denominada villa romana de Sendim, como haverá diversas outras, onde há informes de casas originais (villas) das fundações das paróquias / freguesias, pelo concelho.
No que toca aos vestígios dos Perdidos, em Penacova, como o nome parece sugerir, ali se perdem reminescências históricas, primeiro por as iniciais buscas terem sido através de descobertas particulares, e depois por só tardiamente ter havido trabalhos de estudo. Subjacente a tais fundamentos foram pouco estudados os restos aí encontrados, atendendo ao escasso tempo de procura e de trabalhos desenvolvidos, na década dos anos setenta, do séc. XX, na primeira abordagem de escavações realizadas em terras de Felgueiras na era comtemporânea. Onde, antes e depois, apareceram diversas inscrições rupestres, um interessante espólio de canalizações de águas romanizadas e também um género de tesouro em denários de prata (moedas romanas), cujo lote ficou parcialmente desmembrado, dispersas que foram as peças pela procura e aquisição de curiosos e coleccionadores, antes de haver atenção e intervenção de entidades, sendo então a título oficial apenas recuperada uma pequena parte. Depois, os trabalhos de permeio ali iniciados não tiveram continuidade, ficando abandonadas tais ruínas, com aquilo ao dispor do tempo, apenas ao abrigo de vegetação bravia, por ora.
Antes tinha havido, há muitos anos, indagações ocorridas num antigo castro, sito no monte do Crasto em Sendim, pesumivelmente também relacionado com lendária cidade castreja, de que quase nada se sabe, a não ser da existência de uma publicação de 1933, incluída numa Homenagem a Martins Sarmento em Guimarães, através de separata sob título «O Castro de Sendim, Felgueiras», por R. de Serpa Pinto. E algumas sondagens mais, de índole algo particular, como aconteceu no monte da Aparecida, em Pinheiro.
De realce, pelo rmeio, emerge dos escombros de outrora a villa romana de Sendim. Onde, depois, aquando da abertura de alicerces para reconstrução de moradia particular, apareceram em 1992 restos de muros e vestígios de cerâmicas de tipologia romana, como outros objectos antigos, originando oficial exumação do correspondente espólio por meio de escavações arqueológicas. Resultou desses trabalhos o aparecimento de diversos fragmentos de cerâmicas de velha utilização comum de outras eras, mais potes, moedas e metais, além de muros e lajes de antiga propriedade. Os dados recolhidos permitiram apontar para existência de casa senhorial e ocupação da mesma a partir de cerca da segunda metade do séc. III e durante o séc. IV, tendo alegadamente acontecido que, com a chegada de Suevos e Vândalos (em 409) a remota villa tenha entrado em declíneo, sendo depois abandonada e acabando destruída, à imagem do que fala a lenda popular da vizinha cidade de Eufrásia que teria existido nessa área, desse lado do monte depois chamado de Santa Quiutéria.
Entretanto, algo mais acresceu com a realização de escavações arqueológicas no Mosteiro de Santa Maria Maior de Pombeiro, em 1998, aquando de uma das fases da recuperação operada nesse antigo cenóbio.
Ao que se seguiu outra sondagem, deveras interessante:
Dando razão ao que escrevemos no Memorial Histórico de Rande e Alfozes de Felgueiras (ed. 1997), quanto a breves referências expostas sobre iniciais estudos que se tinham proporcionado, o Alto de Cimalhas, na fronteira de Sernande, Rande e Varziela, guardava resquícios de velha civilização. Aliás os lugares antigos em torno desse planalto, pela toponímia histórica, referem assimilação derivada, ao que se passa com Longra, de Lôngara, significando algo arqueológico, bem como Castelo e Castela, lugares da encosta de Rande, como também mais alguns outros pelas próprias freguesias ao redor têm nomes dessa procedência. Ou seja, comprova tal passado, da penumbra dos tempos, também as eminências do povoamento primitivo, quanto designam que o mesmo território possui elementos de interligação, como sejam os limites transfronteiriços de freguesias no antigo Monte de Cimalhas. Aí se percebe, no dito local antigamente também chamado Picoto de Cimalhas, como a zona teve população alguns séculos antes da nacionalidade, conforme se encontra documentado a partir pelo menos do séc. X, visto ali se haver elevado um castro (fortificação castreja), em tal sítio remotamente ainda referido como Pico da Cimalha, onde Varziela herdou o nome do lugar do Monte, enquanto Sernande e Rande dividem terras que ficaram conhecidas por lugares de Cimalhas de Cima e de Baixo, ao passo que a Pedreira se chega por Carcavelos, local de designação de antiga fortificação, até à Sobreira, para mais além possuir réstia toponímica de um próprio lugar de Castro (Crasto, na evolução popular). Entre outros casos, nesta singularidade familiar de exemplos múltiplos, na área da actual Vila da Longra. Sendo actualmente o nome Cimalha constante das escrituras do terreno, e naturalmente da sua localização, do chamado Edifício Vila da Longra, construído em 2007 ao fundo da encosta de Cimalhas, na parte da freguesia de Rande, já em pleno centro da vila a que pertence.
Efectivamente, no referido local, ao cimo, inicialmente chamado da Cimalha (aliás nome de todo o antigo monte), apareceram recentemente, desde trabalhos de pesquisa arqueológica efectuados a partir de 2004, uns escassos vestígios, derivado aos desaterros ocorridos nos trabalhos de terraplanagem da ligação à auto-estrada A11, sobremaneira de velho caminho divisório interfreguesias, mas também, com novas sondagens em 2008, antecedendo o rasgamento da continuação da estrada para ligação em viaduto, do alto da Longra/Cimalhas para os próximos lugares de Varziela, apareceram alguns pequenos vasos de deposição de restos funerários, comprovativos de ancestral povoado.
Conforme os dados entretanto difundidos, ali foram detectados vestígios de um habitat da Idade do Bronze, através da análise de cortes do terreno, existindo partículas de cerâmica, o que possibilitou a compreensão do tipo de ocupação do sítio, com realce a determinadas estruturas, de reduzido número de buracos de poste e algumas fossas de silos de armazenamento, paralelamente com recolha de fragmentos cerâmicos que possibilitaram reconstituição de vasos, de largo bordo, tipo de guarida de cinzas funerárias, a par com alguns objectos de pedra, caso de artefactos de moinhos manuais, molde de machado plano e inclusive peças de ferro, como uma pequena estatueta e aldrabas de portadas, entre diversos exemplos.
  
(No texto original: Duas ilustrações visuais dos trabalhos de escavações no alto de Cimalhas)

Atendendo ao que está observado, por meio das intervenções realizadas, e dadas as características do espaço inspeccionado, tem sido concluído tratar-se o caso da Cimalha de parte de um lugar habitado do período do Bronze Final, com vocação agro-pastoril, que se julga com ocupação até cerca do período romano, antes de instalação de próximas villas romanas que viriam a fundar as paróquias circunvizinhas. Pressupondo uma primitiva ocupação do local, entretanto destruída, da qual restam assim diminutos testemunhos. Devendo o aglomerado central do lugar ter desempenhado, em seu tempo, relevo de vigia na defesa dos sítios circundantes, ao género de uma atalaia (de acordo com o espólio dos achados das escavações).
Após os devidos restauros, as peças encontradas no alto dos Perdidos e na Cimalha, junto com as descobertas da villa romana, fazem parte, para já (enquanto não há um museu geral concelhio) do acervo museológico exposto no centro de interpretação de apoio às ruínas de Sendim.

AP

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