Espaço de atividade literária pública e memória cronista

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

Memórias e tradições do dia das Candeias


Candeias do Tempo…! 

Chegado Fevereiro, no mando da tradição com tempo até muito próprio, pois sendo “chuvoso faz o ano formoso”, logo entra a conta das Candeias, a 2 de Fevereiro, na passagem do dia de Nossa Senhora das Candeias. Como tradicionalmente se designa essa data litúrgica da apresentação do Senhor ou da Purificação de Nossa Senhora Mãe de Deus.

Uma época que, devido ao Carnaval ser uma festividade de data móvel, calhando tanto no início, como a meio ou final do mês, se confunde com essa fase, derivada como terá sido de festividades populares de tempos recuados. Sabendo-se disso por se haverem realizado durante a romanização as Lupercais, antes das Calendas de Março, celebradas em honra de Pan, deus dos pastores - relacionando-se a denominação com Lupercus (do latino lobo). Ora esta festa anual estava associada a orgias e outras boémias, pelo que o Papa Gelásio instituiu, em sua substituição, a festa da Purificação ou da Candelária. Não tendo sido, porém, completamente extintos os festejos com os desmandos abusivos do Carnaval, passou depois essa festa religiosa a cingir-se ao dia, como ficou mais conhecido, de Nossa Senhora das Candeias. 

Em dia das Candeias “se (havendo dia chuvoso) Nossa Senhora está a chorar, está o inverno a acabar; se (perante tempo de sol) estiver a rir, está o inverno p’ra vir”, diz a voz popular. Isto segundo o calendário rifoneiro, das fases descritas através de rifões com que a sabedoria popular impregnou os elementos naturais do quotidiano social.

= Nossa Senhora das Candeias ou Rainha da Paz – como em Rande está representada na estatuária paroquial (vendo-se a imagem de Nª Senhora sobre andor, aquando de procissão da festa de S. Tiago de Rande).= 

Eis-nos então neste tempo, de início de Fevereiro e em plena Candelária. As candeias, que, pese tantas transformações operadas na vida normal da sociedade comum e com a religiosidade a ficar algo aquém de antigos hábitos, permanece na memória duma época de afeições, dum tempo romântico aos olhos de nossas recordações. Tal as lembranças que afloram, ao autor destas linhas, sobre tempos da missa das Candeias e, por extensão, do afago de nossa mãe… 

Um destes dias, numa daquelas ocasiões em que nos deixamos levar por pensamentos, nas asas do tempo – em devaneios, até que… zás! – demos connosco a pensar em tempos de infância, quando ia pela mão de minha mãe à igreja e à sua beira ficava, lá no meio, enquanto ela me sussurrava ao ouvido orações, que me entravam com encanto no mais íntimo do ser. Ali, com ela a rodear-me em seus braços, enquanto me ensinava a orar – além de assim, também, me ter à sua beira, para não estar junto aos outros moços, alguns por acaso normal sempre com os sentidos noutros lados e modos. E dei comigo a experimentar como sinto falta, agora, de me achar bem junto à minha mãe, de como tenho saudades dela. Já passaram muitos anos, coisa de um quarto de século, desde que perdemos sua presença física. Mas parece que foi ontem ainda que nos sentíamos abraçados no encosto de seus sussurros carinhosos, ali na igreja, como nos ensinamentos de vida que nos foi dando. E lá veio à mente a missa das candeias, por ser dum tempo marcante, decorrendo o inverno, como agora. Íamos logo pela manhã cedo, com o corpo a tentar espantar o frio, ainda a noite dominava o horizonte de breu, perante o caminho alumiado por lanternas, tal a escuridão (também coisa que volta ao panorama, nos dias que correm com as poupanças atuais em luz pública, enquanto nas altas esfera do poder continua um forrobodó…); e, então naquele tempo, chegados ao templo, resplandecia um ambiente de luz das muitas velas e lâmpadas espalhadas, mais um odor de incenso que se elevava no ar. Ficando-nos, para sempre, na retina memorial, essas manhãs das Candeias, em tais dias, daqueles que tivemos nossa mãe a envolver-nos… ternamente. E, até parecendo, apesar da penumbra do alvorecer da manhã, sem ter rompido ainda o sol, que nossa senhora sorria…! 

© Armando Pinto